Excesso de tempo dedicado ao dever de casa pode prejudicar desempenho, mostra estudo

Resultados de pesquisa revelaram que alunos que estudavam mais de 1h30 tinham queda nas notas. Pedro Santos da Fonseca , do 8º ano da Escola Parque, recebe uma carga de deveres na qual gasta cerca de uma hora por dia

Um grupo de mães do Colégio Marista São José, no Rio de Janeiro, organizou uma comissão para reivindicar, entre outros pontos, mais dever de casa para os filhos. Pensando no bem dos pequenos, elas querem que a escola aumente a quantidade de tarefas, um pedido que outros colégios públicos e particulares também já ouviram dos familiares. Só que muito dever de casa pode não fazer tão bem assim. Ao menos é o que dizem especialistas e um estudo recente da Universidade de Oviedo, na Espanha.

A pesquisa, publicada na revista “Journal of Educational Psychology” da Associação Americana de Psicologia, avaliou 7.725 alunos espanhóis, com média de 13 anos, e concluiu que o ideal é dedicar à tarefa cerca de uma hora diária, e que muito mais que isso pode, inclusive, atrapalhar o rendimento dos estudantes. Segundo os pesquisadores, tão importante quanto o tempo é a regularidade e a maneira como a lição é feita, isto é, se o aluno conta ou não com a ajuda de outras pessoas.

Os resultados mostraram que a partir de 1h30 a 1h40 de estudo houve queda nas notas. Já os que utilizavam entre 1h10 e 1h30 tiveram pequenos ganhos, mas que quando comparados aos dos que ocupavam apenas uma hora diária se mostraram inexpressivos — afinal, gastavam-se quase duas horas a mais por semana para atingir um resultado não muito superior. Dessa forma, os pesquisadores concluíram que o benefício de estudar em média uma hora é maior.

Além disso, foi observado que os alunos que recebiam deveres de casa com regularidade conseguiam uma pontuação maior nos testes do que aqueles que tinham uma frequência menor de lições; e os que faziam o dever sozinhos conseguiram nota melhor que os que recebiam ajuda frequentemente.

Objeto de pesquisas constantes no meio acadêmico, o dever de casa também está longe de ser consenso no cotidiano escolar. Há pesquisas que mostram eficácia maior ou menor, a depender do contexto. Um estudo feito na Alemanha em 2002, com alunos do sétimo ano, também concluiu que era mais efetivo passar poucos deveres de casa — mas sempre corrigidos pelos professores, de modo a monitorar o desempenho dos alunos e corrigir problemas de aprendizagem — do que obrigar estudantes a passarem muito tempo fazendo lições, sem garantia de que esse retorno aconteça.

O motim das mães maristas evidencia que a questão é vista de maneira diversa não só por diferentes instituições, mas também pelos próprios pais.

— Estávamos vendo muito pouco dever e resolvemos reivindicar. Eu sou contra o massacre, com quantidade enorme de lição, mas o dever é importante para desenvolver a autonomia deles. Eles (a direção) falam que é para pegar leve, para a criança querer estudar— argumenta Claudia Koslowski, mãe da aluna Clara Correa, do 6º ano do Colégio Marista.

Em meio às reivindicações, a vice-diretora da instituição, Rita Rocha, explica os motivos da metodologia adotada e defende que o sistema prioriza a qualidade dos exercícios.

— É uma discussão muito presente na escola e é necessário usar o bom senso. Sempre queremos encontrar a proposta mais adequada para o aluno, mas sempre vamos ter famílias que se posicionam a favor de mais dever ou de menos. A escola tem que ter muita clareza do objetivo. É importante frisar que não estamos falando de quantidade, e sim de qualidade, de nível de elaboração, de organização — argumenta Rita.

Em uma linha parecida com a do Colégio Marista, a Escola Parque, na Zona Sul do Rio, criou um sistema on-line para que a equipe pedagógica da escola monitore a quantidade de lição recomendada diariamente aos alunos. De acordo com o colégio, não é interessante que os estudantes levem enormes quantidades de deveres se a correção de todas as questões não for viável.

— Os deveres são publicados em uma plataforma virtual, e quando percebemos que a carga está alta demais falamos com o professor. A gente acredita que a carga de uma hora de dever é bastante palatável para jovens que têm como profissão ser estudantes. Em média é o tempo que passamos, mas isso também pode variar — explica o orientador pedagógico do colégio, Luís Albuquerque.

Enquanto folheia o livro de Paulo Leminski em busca de uma poesia para ler no sarau do colégio, Pedro Fonseca, aluno do 8º ano da Escola Parque, conta que gosta da quantidade e, principalmente, do modelo dos exercícios que recebe como tarefa. O aspirante a skatista, que ainda não sabe o que quer ser no futuro, diz que no colégio onde estuda “tem mais espaço para se expressar” e afasta as provocações dos colegas de instituições nas quais a quantidade de lição é maior.

— Meus amigos brincam porque minha quantidade de dever é menor. Mas não significa que seja fácil, só é diferente — defende.

NOVENTA EXERCÍCIOS POR SEMANA

Bruna Reis está no 9º ano do Colégio PH e gasta, em média,duas horas por dia para fazer a tarefa. Apesar do trabalho, a aluna garante que a quantidade de deveres faz diferença nos seus resultados

Em uma realidade diversa, a aluna Bruna Reis, do 9º ano do Colégio PH, se desdobra entre a natação, o escotismo e cerca de 90 exercícios por semana — aproximadamente duas horas por dia. Mas, todo o trabalho, na opinião dela, é eficaz.

— Sempre reclamamos de muito dever, mas, no fundo, é o que faz a gente estudar. É o momento que vejo onde errei, o que é importante. O dever acaba virando um referencial — explica.

A mãe da adolescente pondera que não existe modelo certo. Usando o exemplo do filho mais novo, que também estuda na escola, afirma que cada aluno tem uma maneira diferente para se desenvolver.

— Quando escolhi o colégio, me falaram da proposta de exercitar ao máximo com o aluno. Eu acreditava que, quanto mais exercício, melhor. Foi uma aposta. A Bruna se adaptou, atende bem à proposta. Já meu outro filho não aceita. Não existe o melhor sistema, existe o melhor modelo para seu filho — afirma Daniela Reis.

A diretora pedagógica da escola, Eliana Vital Brazil, explica que a estratégia foi pensada para fazer com que o aluno crie o hábito de estudo. E é importante para fixar o conteúdo aprendido.

— O aluno recebe 90 questões por semana e para dar conta tem que fazer uma cota diária. A rotina de dever de casa é importante para que ele saiba que tem que sentar e estudar todo dia — explica a diretora, que destaca ainda a importância de os alunos fazerem o dever sozinhos: — Eles têm que fazer para que tenham dúvidas. Temos monitoria, mas não a vemos como uma muleta ou como um professor particular que vai mastigar o conteúdo para o aluno.

Doutora em educação pela Uerj, a pesquisadora Patrícia Maneschy argumenta que nem sempre uma grande quantidade de tarefas é sinal de sucesso. Acrescenta que muitas vezes os pais não compreendem a maneira como a aprendizagem é adquirida, e acabam fazendo a lição no lugar dos filhos.

— Muito dever de casa não significa, necessariamente, que a criança esteja aprendendo. Muitas vezes, os pais acabam fazendo os deveres para colher os louros, para que o aluno não entregue errado — destaca.

Para Patrícia, é fundamental também que o assunto seja discutido durante a formação dos professores.

— Na formação dos cursos de pedagogia, as discussões ficam no âmbito da didática, com conteúdos muito generalistas. De alguma maneira o assunto acaba ficando muito superficial. Quando se estuda sobre o dever de casa, é em curso de extensão — disse.

A lição de casa também é alvo de atenção na rede pública. A Secretaria municipal de Educação do Rio afirma que os professores são orientados a passar dever regularmente.

— Cada escola tem de fazer um estudo para não sobrecarregar o aluno. No caso dos pequenos, que têm só um professor, ele pode dosar isso. E no segundo segmento, os alunos já devem ter a noção de que o aprendizado não acaba na escola — explica a secretária Helena Bomeny, adicionando que, nas férias, os alunos da educação infantil levam para casa um dever especial de fixação do conteúdo e os mais velhos recebem indicações de livro

Resultados de pesquisa revelaram que alunos que estudavam mais de 1h30 tinham queda nas notas. Pedro Santos da Fonseca , do 8º ano da Escola Parque, recebe uma carga de deveres na qual gasta cerca de uma hora por dia

Um grupo de mães do Colégio Marista São José, no Rio de Janeiro, organizou uma comissão para reivindicar, entre outros pontos, mais dever de casa para os filhos. Pensando no bem dos pequenos, elas querem que a escola aumente a quantidade de tarefas, um pedido que outros colégios públicos e particulares também já ouviram dos familiares. Só que muito dever de casa pode não fazer tão bem assim. Ao menos é o que dizem especialistas e um estudo recente da Universidade de Oviedo, na Espanha.

A pesquisa, publicada na revista “Journal of Educational Psychology” da Associação Americana de Psicologia, avaliou 7.725 alunos espanhóis, com média de 13 anos, e concluiu que o ideal é dedicar à tarefa cerca de uma hora diária, e que muito mais que isso pode, inclusive, atrapalhar o rendimento dos estudantes. Segundo os pesquisadores, tão importante quanto o tempo é a regularidade e a maneira como a lição é feita, isto é, se o aluno conta ou não com a ajuda de outras pessoas.

Os resultados mostraram que a partir de 1h30 a 1h40 de estudo houve queda nas notas. Já os que utilizavam entre 1h10 e 1h30 tiveram pequenos ganhos, mas que quando comparados aos dos que ocupavam apenas uma hora diária se mostraram inexpressivos — afinal, gastavam-se quase duas horas a mais por semana para atingir um resultado não muito superior. Dessa forma, os pesquisadores concluíram que o benefício de estudar em média uma hora é maior.

Além disso, foi observado que os alunos que recebiam deveres de casa com regularidade conseguiam uma pontuação maior nos testes do que aqueles que tinham uma frequência menor de lições; e os que faziam o dever sozinhos conseguiram nota melhor que os que recebiam ajuda frequentemente.

Objeto de pesquisas constantes no meio acadêmico, o dever de casa também está longe de ser consenso no cotidiano escolar. Há pesquisas que mostram eficácia maior ou menor, a depender do contexto. Um estudo feito na Alemanha em 2002, com alunos do sétimo ano, também concluiu que era mais efetivo passar poucos deveres de casa — mas sempre corrigidos pelos professores, de modo a monitorar o desempenho dos alunos e corrigir problemas de aprendizagem — do que obrigar estudantes a passarem muito tempo fazendo lições, sem garantia de que esse retorno aconteça.

O motim das mães maristas evidencia que a questão é vista de maneira diversa não só por diferentes instituições, mas também pelos próprios pais.

— Estávamos vendo muito pouco dever e resolvemos reivindicar. Eu sou contra o massacre, com quantidade enorme de lição, mas o dever é importante para desenvolver a autonomia deles. Eles (a direção) falam que é para pegar leve, para a criança querer estudar— argumenta Claudia Koslowski, mãe da aluna Clara Correa, do 6º ano do Colégio Marista.

Em meio às reivindicações, a vice-diretora da instituição, Rita Rocha, explica os motivos da metodologia adotada e defende que o sistema prioriza a qualidade dos exercícios.

— É uma discussão muito presente na escola e é necessário usar o bom senso. Sempre queremos encontrar a proposta mais adequada para o aluno, mas sempre vamos ter famílias que se posicionam a favor de mais dever ou de menos. A escola tem que ter muita clareza do objetivo. É importante frisar que não estamos falando de quantidade, e sim de qualidade, de nível de elaboração, de organização — argumenta Rita.

Em uma linha parecida com a do Colégio Marista, a Escola Parque, na Zona Sul do Rio, criou um sistema on-line para que a equipe pedagógica da escola monitore a quantidade de lição recomendada diariamente aos alunos. De acordo com o colégio, não é interessante que os estudantes levem enormes quantidades de deveres se a correção de todas as questões não for viável.

— Os deveres são publicados em uma plataforma virtual, e quando percebemos que a carga está alta demais falamos com o professor. A gente acredita que a carga de uma hora de dever é bastante palatável para jovens que têm como profissão ser estudantes. Em média é o tempo que passamos, mas isso também pode variar — explica o orientador pedagógico do colégio, Luís Albuquerque.

Enquanto folheia o livro de Paulo Leminski em busca de uma poesia para ler no sarau do colégio, Pedro Fonseca, aluno do 8º ano da Escola Parque, conta que gosta da quantidade e, principalmente, do modelo dos exercícios que recebe como tarefa. O aspirante a skatista, que ainda não sabe o que quer ser no futuro, diz que no colégio onde estuda “tem mais espaço para se expressar” e afasta as provocações dos colegas de instituições nas quais a quantidade de lição é maior.

— Meus amigos brincam porque minha quantidade de dever é menor. Mas não significa que seja fácil, só é diferente — defende.

NOVENTA EXERCÍCIOS POR SEMANA

Bruna Reis está no 9º ano do Colégio PH e gasta, em média,duas horas por dia para fazer a tarefa. Apesar do trabalho, a aluna garante que a quantidade de deveres faz diferença nos seus resultados

Em uma realidade diversa, a aluna Bruna Reis, do 9º ano do Colégio PH, se desdobra entre a natação, o escotismo e cerca de 90 exercícios por semana — aproximadamente duas horas por dia. Mas, todo o trabalho, na opinião dela, é eficaz.

— Sempre reclamamos de muito dever, mas, no fundo, é o que faz a gente estudar. É o momento que vejo onde errei, o que é importante. O dever acaba virando um referencial — explica.

A mãe da adolescente pondera que não existe modelo certo. Usando o exemplo do filho mais novo, que também estuda na escola, afirma que cada aluno tem uma maneira diferente para se desenvolver.

— Quando escolhi o colégio, me falaram da proposta de exercitar ao máximo com o aluno. Eu acreditava que, quanto mais exercício, melhor. Foi uma aposta. A Bruna se adaptou, atende bem à proposta. Já meu outro filho não aceita. Não existe o melhor sistema, existe o melhor modelo para seu filho — afirma Daniela Reis.

A diretora pedagógica da escola, Eliana Vital Brazil, explica que a estratégia foi pensada para fazer com que o aluno crie o hábito de estudo. E é importante para fixar o conteúdo aprendido.

— O aluno recebe 90 questões por semana e para dar conta tem que fazer uma cota diária. A rotina de dever de casa é importante para que ele saiba que tem que sentar e estudar todo dia — explica a diretora, que destaca ainda a importância de os alunos fazerem o dever sozinhos: — Eles têm que fazer para que tenham dúvidas. Temos monitoria, mas não a vemos como uma muleta ou como um professor particular que vai mastigar o conteúdo para o aluno.

Doutora em educação pela Uerj, a pesquisadora Patrícia Maneschy argumenta que nem sempre uma grande quantidade de tarefas é sinal de sucesso. Acrescenta que muitas vezes os pais não compreendem a maneira como a aprendizagem é adquirida, e acabam fazendo a lição no lugar dos filhos.

— Muito dever de casa não significa, necessariamente, que a criança esteja aprendendo. Muitas vezes, os pais acabam fazendo os deveres para colher os louros, para que o aluno não entregue errado — destaca.

Para Patrícia, é fundamental também que o assunto seja discutido durante a formação dos professores.

— Na formação dos cursos de pedagogia, as discussões ficam no âmbito da didática, com conteúdos muito generalistas. De alguma maneira o assunto acaba ficando muito superficial. Quando se estuda sobre o dever de casa, é em curso de extensão — disse.

A lição de casa também é alvo de atenção na rede pública. A Secretaria municipal de Educação do Rio afirma que os professores são orientados a passar dever regularmente.

— Cada escola tem de fazer um estudo para não sobrecarregar o aluno. No caso dos pequenos, que têm só um professor, ele pode dosar isso. E no segundo segmento, os alunos já devem ter a noção de que o aprendizado não acaba na escola — explica a secretária Helena Bomeny, adicionando que, nas férias, os alunos da educação infantil levam para casa um dever especial de fixação do conteúdo e os mais velhos recebem indicações de livro

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